
Qualquer conhecedor da história brasileira sabe que as Forças Armadas estão tão próximas da corrupção como o pus da ferida

Durante os 21 anos de regime militar no Brasil (1964–1985), o país viveu uma intensa repressão política, censura à imprensa e supressão de direitos civis. Nesse cenário, a narrativa oficial promovia uma imagem de moralidade e ordem. No entanto, por trás das fardas e discursos patrióticos, diversos escândalos financeiros ocorreram — muitos abafados à época e revelados somente anos depois, quando documentos foram liberados e investigações retomadas.
Caso Lutfalla (1977)
Envolvendo o então governador biônico de São Paulo, Paulo Maluf, o escândalo Lutfalla dizia respeito a empréstimos fraudulentos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE) a empresas da família de sua esposa, Sylvia Lutfalla. A empresa beneficiada estava tecnicamente falida, mas continuou recebendo recursos estatais.
Grupo Delfin e o rombo no sistema habitacional (1982)
O Grupo Delfin, maior sociedade de crédito imobiliário do país na época, acumulou uma dívida bilionária com o extinto Banco Nacional da Habitação (BNH). Em 1982, o governo aceitou terrenos superfaturados como pagamento. O caso envolveu três ministros: Delfim Netto (Planejamento), Mário Andreazza (Interior) e Ernane Galvêas (Fazenda).
Banco Halles: intervenção e prejuízo público (1974)
O Banco Central interveio no Banco Halles em 16 de abril de 1974. A instituição enfrentava insolvência após má gestão e operações de risco. Foi posteriormente absorvida pelo Banco do Estado da Guanabara (BEG), gerando um rombo financeiro ocultado à época.
Fechamento arbitrário da Panair do Brasil (1965)
A cassação da empresa aérea Panair, em 10 de fevereiro de 1965, levantou suspeitas de perseguição política e favorecimento à Varig, companhia mais alinhada ao regime. A Comissão Nacional da Verdade, décadas depois, reconheceu que a ação teve motivação política, causando danos à economia e à livre concorrência.
Capemi: a fraude nos benefícios dos próprios militares (década de 1980)
A Caixa de Pecúlios, Pensões e Montepios Beneficente dos Militares (Capemi) foi utilizada para desvio de recursos públicos através de investimentos fictícios, superfaturados ou em projetos fantasmas. O escândalo, pouco divulgado à época, gerou prejuízos milionários.
Obras superfaturadas como marca do regime
Projetos monumentais como a Ponte Rio-Niterói, a Rodovia Transamazônica e a Usina de Itaipu foram marcados por licitações duvidosas e contratos com sobrepreço. A ausência de fiscalização e o sigilo imposto pela ditadura permitiram práticas de corrupção em larga escala.
Sérgio Fleury e a corrupção institucionalizada
Delegado do temido DOPS, Sérgio Paranhos Fleury acumulava denúncias de envolvimento com o crime organizado, tráfico de drogas e grupos de extermínio. Era protegido pelo regime militar e nunca foi responsabilizado judicialmente.
Apesar do discurso de que “na ditadura não havia corrupção”, os fatos históricos e documentos oficiais demonstram o contrário. A repressão, a censura e a ausência de mecanismos de controle público criaram um terreno fértil para escândalos financeiros e desmandos. Muitos dos casos só vieram à tona após a redemocratização, reforçando a importância da imprensa livre, da transparência e da democracia para a fiscalização do poder.